terça-feira, 27 de março de 2007

Na ordem da foto: Selena e Celina

.... Num lugar qualquer do Piauí, numa cidadezinha pequenina e bucólica, certo final de tarde, quando o sol em brasa se escondia por trás dos morros, ejaculou uma diva lua estonteante que alumiava o breu daquele lugar. Os sons da escuridão surgiu, e o silêncio se misturou aos sons da noite, e pirilampos, muitos deles brilhavam em pontos luminosos para o deleite da garotinha que esperava sôfrega o querido avô Oliveiros retornar de Teresina. De noitinha, alegre e entusiasmado chegou em seu cavalo Alazão contando a boa nova:
“-Menina, senta aquí em meu colo, quero falar-te, eu vi tua irmã, tu se parece com ela, é cara de uma e o focinho da outra. Eu a vi. Acredita! Ela têm os teus olhos vivos e tua sagacidade. A vi ontem, e a presenteei uma moeda para comprar doce. Ela vive na casa do teu pai, lá em Teresina.”
A garota ficou atônita mais logo dispersou, tinha uns três, quatro anos no máximo, lânguida de vestidinho floral plissado, sentada no chão a brincar com suas bonecas e a penteá-las ao ponto de quebrar os cabelos. Alisava as melenas a fazer cachos em Rebeca, nome dado à boneca de louça, e em Dora trançava seus negros cabelos de lã, esta era uma linda boneca de pano tão fofinha que parecia um travesseiro, feita com singular carinho pelas mãos de sua avó Nenêm. Embalava-se sob o olhar cuidadoso do avô e flutuava no balanço de corda e pneu acalentando-as, cada uma em sua hora.
“-Vovô, Dora é muito trabalhosa e a Rebeca é mansa, dou de comer e de beber e as coloco para dormir mais a teimosa dessa boneca de pano não dorme! Vou deixá-la de castigo sentada todo o dia, se teimar de novo a coloco de ponta a cabeça.”
"-Ora bolas, tu dependuras a boneca em teu pescoço pelos cabelos, como pode se zangar porque ela não dorme? Trata com carinho, mima, só assim os 'zói' dela murcham, e não a segura pelos cabelos que dói! Se tu sabes que dói, porquê fazes assim?”
Bastou uma vez para a garota aprender, fez o que o avô aconselhou e a teimosa dormiu.
No dia seguinte, todos reunidos no terreiro, sentados, areia fria serpenteava sob os pés, luarada, violão choroso, cantigas a voar, palmas com vibracao de chuva, o avô conversava rodeado a contar seus causos, depois cantava, e em seguida voltou-se à menina e lançou o verbo:
"-Vi! Olhei no início da semana tua irmã. Tu queres saber, Celene? Ela se chama Celina. Vocês são gêmeas!"
E a garota sem entender de verdade continuava a mexer suas panelinhas e dar água e bolinhas de pão à Rebeca e Dora:
“-Bebam e comam minhas filhas, estou mandando, ou querem ficar doentes e amarelas?!”
Oliveiros retrucava: "-Tu queres conhecê-la?"
E a menina não entendia, mas ouvia, selecionava o que queria ouvir e logo deletava. Evasiva, não decodificava a informação de seu avô. Aquelas palavras não significavam nada, não pensava nada, eram palavras ao vento. Talvez achasse que era uma irmã de desenho animado, talvez tirada de um sonho, de revista em quadrinhos ou quiçá fosse até uma boneca.. Bastante perspicaz aprendeu a ler aos quatro anos, por incentivo de seu avô que a deu um livro de presente. Logo foi ao primeiro jardim, porém estava atrapalhando os outros alunos sendo chamada de louca pela professora; enquanto os coleguinhas usavam guache e engatinhavam nas vogais, ela escrevia frases e textos em forma de carta para sua amada tia Didi que morava em Recife. Apoderava-se da lousa atrapalhando a aula seguir. Chamaram então a mãe, que foi orientada a levá-la a uma escola sendo aceita como ouvinte. Assistia as aulas, embora não seria matriculada, ainda era novinha. Todavia se saindo uma das melhores alunas da sala, seus pais foram orientados a regularizar a matrícula. Naquela ocasião, aos seis anos, a menina descobriu-se diferente, a ficha começou a cair, havia outra familia e mesmo assim não entendia direito. Ao ser questionada por uma professora o fato de ser filha da Lurdinha e na sua certidão ter nomes de outros pais, enfureceu-se. Chamou a professora de mentirosa, chorou, gritou, bradou, xingou contumaz a tarde inteira, amaldiçoou tudo que tinha pernas e se mexia, berrou, sacudiu as pernas com calundú até ficar sem ar, cansou de tanto bramir e dormiu na carteira lambuzada de lágrimas. Adormeceu susurrando:
“-Não. Eu usó tenho os meus pais, Lurdinha e Zezé.”
Só então daí se conscientizou ter outra familia com outros irmãos e uma irmã gêmea...
E daquela maneira sutil, lúdica e bem humorada, na mais tenra idade, meu avô começou a abrir minhas janelas sobre ser adotada, e de alguma forma floresceu mesmo que inconsciente a vontade de conhecer minha irmã gêmea. E na singeleza atos se guardam e se juram: no cuidado, na proteção, na lealdade, na afeição dedicada e constante. Sentimentos não. Não se pode prometer sentimentos toda uma vida. Meu avô, meu ídolo: foi sábio. Percebeu a necessidade de me contar leve e sem dor. Dessa forma esta história se apresentou para mim como um livro que eu não havia -ainda- lido, um vulcão adormecido. Mas quando o li reconheci a maravilhosa catástrofe que este causou em minha vida.
Celina, me distanciei de nossa bonita história para contá-la neste espaço e neste dia. Enxerguei a menina de ontem e a desenhei às teclas. Hoje completamos mais uma primavera, temos uma bela flora em nossa caminhada, não gozamos a meninice juntas e tanta coisa que nem dá para listar.., mais vai aí algumas: olhar as formigas carregar as folhas, as cores e texturas da areia, das plantas e do firmamento, o por-do-sol, os raios costurando o céu, os eclipses, os banhos de chuva e de lagoa, a primeira queda de bicicleta, o terror do poço, bater a colher no prato de esmalte branco, subir em árvores, as cantigas de rodas, andar de carroça, beber leite-mugido na mesma caneca, a troca dos primeiros dentes, as doenças pueris, as brincadeiras dessa fase que provoca reações como euforia, alegria, medo, fome e regozijo, e principalmente o cheiro da infância. Perdemos muita coisa e não há como negar. Na contramão dos nosssos desejos fomos afastadas. Não vingou! Eu nunca me identifiquei com tal atitude de nossos pais. Ainda penso que foi uma crueldade. Nos reencontramos na pré-adolescência e resgatamos o que ainda poderia ser prazeroso. E é! Dia desses assisti na novela passada, num tribunal sobre a guarda de filhos, uma desembargadora fazer a observação acerca o fato de gêmeos terem uma ligação que nem a ciência conseguiu ainda explicar. Não raro por serem duas pessoas diferentes em uma segunda pele. E quer saber? Devia ser proibido separar irmãos, especialmente os gêmeos!
besos besos besos irmã querida, e para nós: love, "money no bolso, saúde e sucesso.."

domingo, 25 de março de 2007

Espanha, terra dos extremos e do contraste

Terra de Federico Garcia Lorca, um dos escritores mais lidos da Espanha depois de Cervantes. Granada é cheia de história mas também moderna e vibrante, um contínuo ir e vir de pessoas passeando pelas "calles" e por suas bucólicas praças. Definitivamente sedutora, uma autêntica tentação para qualquer viajante; desperta os sentidos e impele a andar a pé desbravando os mistérios que guarda. É linda e encantadora! Mais do que eu e minha vã filosofia esperava, magia e lenda andam de mãos dadas como se entrassem dentro de um livro. Localizada na região de Andaluzia, aos pés da Serra Nevada (um Édem de colinas cobertas de neve), remete a uma atmosfera dos contos de mil e uma noites. A verdade é que respira-se um ar tão árabe que chega-se a pensar, seguramente, que nao é a Espanha. É também detentora de um dos palácios marroquinos mais belos, conservados e talvez o mais antigo dos que restam no planeta. Considerado por muitos de seus visitantes uma das 10 maravilhas do mundo, uma tentativa islâmica de criar o Céu na terra, Los Palácios de La Alhambra recebe cerca de 8000 visitantes por dia, com várias salas, e em anexo Los Jardines del Generalife que são jardins suntuosos e exuberantes repleto de fontes minuciosamente desenhado com a mais deliciosa estética de flora, capaz de satisfazer ao olhar mais exigente. Fala-se na verdade que estes jardins têm sido objeto de inspiraçao aos artistas e poetas. Os jardins do palácio -ou dos palácios- têm várias salas diferentes, foi construído em 1319 e até hoje conserva grande parte de sua forma original. Comenta-se que a origem de Granada -última capital de Andaluzia- parece misteriosa, muitos de seus rincões estão envoltos em lendas e fábulas em que convertem este lugar a "mágico". Se diz além disso que há teorias incríveis, desde remontar a sua criaçao ao bíblico Noé, passando por Hércules, até distintas civilizaçoes mediterrâneas da antiguidade. Sendo assim umas das primeiras cidades da península Ibérica. É pitoresco e belo! Fascínio total! Incita a paixão.
Adoro coisas que me remetem às profundezas do passado, cai maravilhosamente ao meu estado de espírito, me deixa abençoada, sei lá, me sinto de alguma forma adentrando outras vidas. A encantadora Granada "lançou-me" a vários pontos de vista sobre várias coisas, ou talvez, a um outro despertar. Conheci e vivênciei coisas diferentes, sou a mesma; e no entanto, outra. Viajar é um composto inebriante de nós e do lugar. Já que a cultura é híbrida, está sempre em movimento e em constante mudança.... ....e sob o sono dos séculos vive Granada!!!
Granada - Espanha

segunda-feira, 19 de março de 2007

Até quando?

Olá caros amigos e visitantes deste canto nem tanto ególatra, um tanto egóico, totalmente paranóico, mais ou menos egocêntrico, por vezes débil, talvez noiado, quiçá narcisista... Sim. Tudo junto somado e, noves fora, nada! Um blog é também "ego" inflado, de alguma forma assim é, mas também comichão por escrever e vomitar o que se gosta ou desgosta, ou aprecia; ou não. Hoje este completa seis ''6'' meses da esfera virtual. Nesse caso posso afirmar que a cada dia que passa me deparo com a parte chata, a preguiça. Ai, que preguiça postar um pastelão mexicano vez ou outra. Pára a nave que eu quero descer, me poupem de mim mesma! Todavia viver é um melodrama novelístico real, uma roleta russa. Vou relativizar: mil contas a pagar, conviver, sobreviver, educar-se, deseducar-se, coexistir, SER ou não ser. Elementar. Sim., e mudando de pato para ganso -como já falei antes- penso em DECRETAR FALÊNCIA múltiplas de meus sentimentos quase diários. Para frente as malas batem. Perco a pose mais não os amigos. Obrigada à todas as entradas. Dêem-me uma visitinha! Entonces para comemorar os seis meses deste drama, pergunto à vocês: De onde nasce o amor? E a paixão vem de onde? Qual a diferença entre os dois?

sábado, 17 de março de 2007

haja palavras para o que não digo..

Há palavras que nos beijam, que é porto de abrigo. Nuas., decodificadas., constroem. Palavras que o vento leva, e traz. Palavras que perfumam, têm cheiro de mar e de colo de mãe. Palavras com sabor de aconchego. Aladas não se perdem; encontram-se na virtude. Palavras no silêncio dum olhar. Palavras que correm descontroladas em forma de lágrima, ou de gestos.. Palavras que mordem docemente, benditas não culpam os dentes nem a língua. Palavras que ajudam a acordar. Palavras em forma de boca, de beijos e de mimos. O caminho seja o das boas palavras. Demo-lhes asas. São tantas..

sexta-feira, 16 de março de 2007

Da ternura

Cacá, uma dos três amores da minha vida.

Líquida como água.

Forte e frágil.

O olhar transparente,

sereno,

direto,

legítimo.

O riso franco,

exato,

explosivo,

contagiante.

.. e simples.,

quarta-feira, 14 de março de 2007

ferida que não se farta

.. O amor foi tão grande que dobrou o entardecer em oito pedaços de papel seda carmim. Rutilante brasas inflamadas contra cortinas violetas do vão a cortar nuvens acesas do mosaico de cores que jazia.. e abriu-se a escuridão.. Quedaram num beijo alucinógeno; mãos nervosas, bocas ferozes, línguas aderentes. Alimentavam-se de verbos lançados, aspiravam ópio viciados de paixão. Bebiam seus próprios líquidos. Venciam a noite com o vinho quente e úmido dos enlouquecidos.., e em fatias cortaram a madrugada como a um bolo recheado de amados e amantes, deliciaram-se com seus odores até o romper do crepúsculo.. impregnaram-se de goles intensos de lascívia, embriagados, invadidos!.. depois morreram..

segunda-feira, 12 de março de 2007

mais de mim..

Foto: Veneza - Itália

Saboreou cada nota, devagar. Sentiu. Arrepiou-se. Deixou-se possuir pelo som viajante. Percorreu lugarejos e o tempo, voou ao passado, se via com seis anos, de botinhas marrons e vestido roséo bordado com o ponto casinha de abelha. Na cabeça laços vermelhos enfeitavam a palidez do rosto.

Coração entoando a batida certa. Consumiu a melodia, em seguida veias a pulsar. Carmina Burana a impregnava. Corria das mãos às pontas dos dedos, deslizou nos olhos, depois na face, saiu pelos poros, dançou nos cabelos, explodiu na alma e só depois vazou aos ouvidos. E ouviu como se fosse a última vez. E assim foi!

E se fez a palavra, e o verbo, e a frase, e o texto, e a MÚSICA; dolente e cadente, lancinante e enternecida, carente e vibrante, lamentosa e referente, tocante e bela, transportadora e aflitiva, assustadora e atemporal, lúgubre e ensolarada, devoradora e insaciável.. e.., Paciente.

quinta-feira, 8 de março de 2007

...e Deus criou a mulher

Poemas para todas as mulheres
Vinicius de Moraes
No teu branco seio eu choro.
Minhas lágrimas descem pelo teu ventre
E se embebedam do perfume do teu sexo.
Mulher, que máquina és, que só me tens desesperado
Confuso, criança para te conter!
Oh, não feches os teus braços sobre a minha tristeza não!
Ah, não abandones a tua boca à minha inocência, não!
Homem sou belo
Macho sou forte, poeta sou altíssimo
E só a pureza me ama e ela é em mim uma cidade e tem mil e uma portas.
Ai! teus cabelos recendem à flor da murta
Melhor seria morrer ou ver-te morta
E nunca, nunca poder te tocar!
Mas, fauno, sinto o vento do mar roçar-me os braços
Anjo, sinto o calor do vento nas espumas
Passarinho, sinto o ninho nos teus pêlos...
Correi, correi, ó lágrimas saudosas
Afogai-me, tirai-me deste tempo
Levai-me para o campo das estrelas
Entregai-me depressa à lua cheia
Dai-me o poder vagaroso do soneto, dai-me a iluminação das odes, dai-me o [cântico dos cânticos
Que eu não posso mais, ai!
Que esta mulher me devora!
Que eu quero fugir, quero a minha mãezinha quero o colo de Nossa Senhora!
Poema extraído do livro "Vinicius de Moraes — Poesia completa e Prosa",
Editora Nova Aguillar — Rio de Janeiro, 1998, pág. 262.

segunda-feira, 5 de março de 2007

Sentimentos..

Deslizava nas sete cores do arco-íris de uma ponta a outra como num escorregador se jogando entre os pingos que começava a cair. Pulava, rolava, nadava a braçadas, mergulhava no horizonte. Afogava-se no céu e voava ao sabor do vento feito a aerodinâmica das borboletas. Contemplava o firmamento azul anil, e quanto mais livre sentia-se, mais se assombrava, mais agradecia ao deleite que a tornava leve. Na teia do espaço se agarrava às moléculas do oxigênio como se fosse uma hóstia.. e cavalgava no ar.. e bebia a chuva.. e pisava nas gotas grossas.. e sentia cócegas nos pés. Observava do alto com uma sensibilidade delirante as árvores serem possuídas pelo choro celestial, apreciava a dança, uma a uma, singularmente: as mangueiras imponentes, as bananeiras flutuantes, as palmeiras esvoaçantes, o fícus nos jardins, os cajueiros charmosos, as pitombeiras lisas, as goiabeiras singelas e a sua preferida, a azeitona roxa; fruto de sua lembrança mais tenra. E sentindo o verbo nascer da boca do estômago vomitou com uma ferocidade de viver que suprimia qualquer dor: Amo. Amo. Amo. Bela natureza!!

Eu

Simplesmente Selena